quinta-feira, 28 de março de 2013

Croniquinha 2: Dias Nublados


Às vezes penso no que há de bom nos dias nublados. Hoje foi um deles. Amanheceu assim, acinzentado, plúmbeo, com nuvens carregadas. Dizem que nesses dias o céu está pesado, o que remete meu pensamento às características físicas do próprio chumbo em contraste com as do algodão, quando falamos de volume e densidade. A nuvem branca lembra a leveza do algodão, mas a nuvem cinza lembra o peso do chumbo. São a mesma água, o mesmo vapor, mas com densidades distintas, e as nuvens cinzas são mais densas.

Essa característica das nuvens acinzentadas cria sempre uma expectativa, pela iminência da chuva anunciada. De alguma forma, isso deve ser bom para a natureza. Não, não estou falando da natureza física: o solo, as plantas, os animais, o ar, os rios, nós. Falo de outra natureza, daquela imaterial, presente no íntimo da gente, encerrada no peito de cada um de nós. Os dias nublados têm a delicadeza de nos dizer que nada é permanente, que a qualquer momento tudo pode mudar, e que, para isso, precisamos estar preparados.

As nuvens bailam ao sabor dos ventos. Não há no céu nem uma fração do azul que inspira alegria e vida. Elas ocupam todos os espaços para que a sua presença não se torne indiferente, ou pouco perceptível. Deve haver, então, uma razão velada para os dias nublados. Vejo pessoas agasalhadas, caminhando em passos menos acelerados. Vejo casais abraçados, pais com filhos carinhosamente aconchegados em seus colos, ou firmemente seguros pelas mãos junto de si. Vejo idosos nas praças, sentados, solitários, presentes em algum lugar no passado. Percebo, ao olhar para mim mesmo, que este dia nublado permitiu a mim essa doce contemplação.

Por fim, chega a chuva, fina, delicada, a acelerar a cena, a provocar novos e diferentes movimentos. Guarda-chuvas são abertos e o cenário fica multicolorido, numa valsa em que há a dança de círculos de tons e cores variados, mas a música tem seu som proveniente de uma orquestra celestial de gotas que se precipitam ao encontro do solo que as recebe. Sinto, de alguma maneira, a presença de Deus expressando um sorriso terno ao contemplar seus frágeis filhos humanos. Às vezes esqueço que há algo de bom em dias nublados. Que bom! Hoje o dia amanheceu nublado.


Carlos Bianchi de Oliveira
Rio de Janeiro, 28 de março de 2013.

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